O texto abaixo foi escrito há alguns anos atrás... Já se passaram seis meses desde a partida dela para uma nova morada. Hoje mamãe está em outro plano em outra área, cumpriu sua missão na terra.
Por que postar esse texto? Não sei... Faz muito tempo em que só leio as postagens ou posto imagens ou vídeos. Pensei muito nela hoje e ao vasculhar meus escritos encontrei este. Pra quem não conheceu, saiba que ela foi uma grande mulher.
Só tenho a agradecer pelo que sou.
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"Minha mãe Aluiza, que é quem realmente me
gerou, é dela de quem quero falar hoje, e vai ser grande.
Quando pequena vi
minha mãe, saindo todos os dias para trabalhar, morávamos no Bengui, onde ela
hoje ainda mora, mas não na casa que hoje é de alvenaria, não! Era uma casa de
madeira, que tinha uma bomba d’água manual, não tínhamos pia, era um girau,
nosso chuveiro era a cuia, e o meu quarto com meu irmão era a sala, mas minha
mãe me ensinou a dar valor nas coisas que tínhamos, mas não a se conformar, sempre
a lutar, porém com dignidade.
Lembro da minha
mãe muitas vezes enrolando a perna da calça comprida, para então ir ao
trabalho, era moda? Não, não era. Nossa rua ela enchia quando chovia e tínhamos
mesmo que enrolar a barra da calça. Depois aterraram mas continuamos enrolando
a barra da calça, pois o problema depois era a lama da piçarra que grudava na
nossa barra de calça, e, além de enrolar a barra da calça tínhamos que ir com
chinela havaiana (que na época não era tão valorizada quanto hoje), até a rua
Ajax de Oliveira e lá pedir pra alguém pra gente lavar os pés, para então
calçar o sapato para não chegarmos ao centro de Belém todos enlameados. Mas
minha mãe dizia que nossa rua era a melhor possível, pois era onde morávamos.
Minha mãe, que
sempre foi lutadora, ia trabalhar, quando chegava em casa olhava nossos
cadernos e cadernetas para ver se tínhamos ido a aula, depois tomava um banho e
não ia se deitar não... ela ia pra trás de um balcão de bar que tinhamos em
casa. Para trabalhar até mais ou menos 2 horas da manhã, isso quando não
emendava da noite ao dia. Detalhe, minha mãe trabalhava o dia todo. De manhã em
casa até as 10 horas e depois ia pro Liberal, onde era Fotocompositora, um ramo
gráfico que acho que nem existe mais essa função. Lá dentro do Liberal ela
conheceu o sindicalismo, e passou a nos levar para as reuniões e encontro dos
gráficos, depois não era só isso... veio a Campanha do Paulo Rocha e do Zé
Carlos pelo PT. E, ela na luta!
Garanto a todos
que não foi na universidade que conheci o que era movimentos sociais, foi com
ela e com os companheiros dela de luta, que hoje são meus companheiros.
Vi, muitas vezes
minha mãe ser discriminada por ser mãe solteira e cuidar de dois filhos
sozinha... lembro que numa escola que eu estudava eu até bati numa menina por
que ela xingou minha mãe, e faço novamente isso tenho certeza.
Minha mãe parecia
que tinha bola de cristal, pois por mais tempo que ela passasse fora, ela sabia
tudinho o que tínhamos aprontado (nem conto pra vocês que os vizinhos nos
derrubavam... rsrs). Não tínhamos dinheiro pra pagar babá, portanto, quando
minha mãe saia de casa, nos deixava e dizia que eu e meu irmão éramos
responsáveis pela casa. Mas tinha as nossas vizinhas que nos olhava de vez em
quando, pra saber se estava tudo bem por lá.
Nunca vi uma
pessoa ser tantas pessoas numa única pessoa, se é que me entendem?!
Mas a minha mãe
era e é assim.
Vi minha completar
50 anos e ter uma festa maravilhosa e merecida!
Mas depois meu
desespero foi total ao perceber que por um instante eu poderia perder minha
mãe, quando ela teve AVC... eu todos os dias chorava, mas não podia chorar na
frente de ninguém, por que isso ela me ensinou, a não demonstrar fraqueza!
Médicos me
disseram que talvez ela não voltasse a andar, porém mais uma vez ela me mostrou
como ela é forte, pois com três meses que havia saído do hospital não sentou
mais na cadeira de rodas, pois passou a andar com nosso amparo, e hoje já até
sai sozinha... pra mim é uma felicidade, eu imagino pra ela.
Vi muitas vezes
minha mãe preocupada conosco e até hoje é assim... Alex (irmão) e eu já temos
cada um o nosso canto, nossas famílias, mais ela ainda liga pra saber se
estamos bem... e no dia em que ela não liga... sinto falta!
Eu digo pra vocês,
que aqui estão lendo. Ela é uma guerreira, lutadora.
Ela nos criou num
bairro dito perigoso, pela quantidade de violência existente lá, mas sempre nos
mostrou o que iria acontecer conosco se fossemos por aquele caminho, que alguns
colegas nossos enveredaram. Nos mostrou que o Bengui, não era apenas um bairro
cheio de bandidos. Nos mostrou que lá era um bairro que tem história de luta no
movimento social, que muitos movimentos se iniciaram por lá, que se hoje temos
ruas asfaltadas em algumas localizações é pela luta da Associação dos Moradores,
do Emaús, da Igreja e outras mais.
Nos mostrou o que
significa sermos cidadãos de direitos e deveres.
E, é a essa mulher
que devo o inicio do meu conhecimento na área das ciências sociais que é hoje o
curso que fiz e que me formei há um ano atrás, para então dizer a ela:
- Mãe, a senhora é
parte desse sonho realizado!
Mas tem outras guerreiras encarnadas na
mesma pessoa e declarada por outras pessoas que conviveram com ela:
1) a menina que
morava na Domingos Marreiros quando ainda nao havia canal guiando o rio e se
andava sobre uma ponte estreita estirada sobre o mamore a partir da Antonio
Barreto. Se a memoria nao me falha a casa era azul e tinha uma porta e uma
janela na frente, mas nao havia o que se pudesse chamar quintal. Nessa epoca
estudavamos no Colegio Souza Franco quando ainda nao havia Escola de Educacao
Fisica e toda aquela area era parte do Colegio e onde eram dadas as aulas de
educacao fisica;
2) Tem a guerreira
radialista que pelo menos uma vez por semana se abalava de Belem para Marituba
para apresentar a Voz do Pastor, escrito pelo entao Arcebispo Dom Alberto
Gaudencio Ramos para divulgacao atravez da Radio Cultura;
3) Tem a lider
sindical que tomava parte do Sindicato dos Graficos tentando unificar a
campanha sindical com os Jornalistas enquando varava a madrugada na sala de
Composicao do Jornal O Liberal quando este ainda era ancorado na Gaspar Viana.
E por ai vai ....
Te amo mãe!
“Quando pequena aos 7 anos mais ou menos,
saia com minha mãe pelas ruas do Bengui no meio da madrugada pregando cartazes,
em pleno período de campanha. A música que eu mais gostava entoava em todo
canto do país:
“Lula lá! Brilha
uma estrela!/Lula lá! Cresce a esperança!...”
Neste período
Paulo Rocha e Zé Carlos em sua primeira campanha “dobradinha”... saiamos
pregando cartazes em tudo que era postes, mercado, o que viamos. O meu querido
João Gomes, se abaixava e eu subia em seus ombros para pregar o cartaz o mais
alto que eu podia, mas aquela época eram outras, eu era bem menor que ele (rs).
Um grupo de
pessoas, precisavam eleger Lula Presidente, era nossos gritos que precisavam
ser escutados, nossas esperanças que precisavam ser renovadas.
“Lula Lá brilha uma estrela, Lula lá nasce
a esperança”
Aluiza (minha
mãe), Domingas, D. Mercês, Dos Anjos, Livramento, João Gomes, Edir, Paulo
Rocha, Laércio, Palheta... E tantos outros que agora não consigo lembrar, mas
que estão guardados em meu coração.
Zé Carlos veio a prefeito e ainda lembro
de sua música:
“Eu vou votar no Zé, o Zé vai ser
prefeito, eu confio no Zé, pois só com Zé Belém tem Jeito...”
Tempos bons que me ensinaram a ser a
pessoa que sou hoje, e com certeza essas pessoas e muitas outras que não estão
aqui citadas merecem e sempre mereceram meu respeito!
E agradeço a minha mãe por ter
oportunizado conhecer pessoas maravilhosas como estas e muitas outras que se
aqui for citar não terminarei de escrever.
Beijos e abraços e um bom dia a todos!"
Algumas Fotos com ela: